sábado, 18 de junho de 2016

Introdução à lógica temerária


 Um dos últimos vazamentos de recente e copiosa delação premiada sustenta que o presidente interino teria estado envolvido em tenebrosa transação. O indigitado, além da costumeira afirmação de inocência, saiu-se com esta: se fosse verdadeira a acusação eu não poderia ocupar a presidência da república.

Nada de novo no padrão de reação indignada e na afirmação de inocência. Esse é o modelo que tem sido seguido por todos os citados. O que é de notar como fato inovador é o extraordinário uso da inferência lógica, na resposta interino-presidencial. Vejamos: em linguagem natural, o denunciado declara que caso fosse verdadeira a sua desonestidade, isso teria como implicação a impossibilidade do mesmo vir a ocupar a presidência. O que se segue, portanto, é o seguinte: se eu estou a ocupar a presidência, logo sou honesto.

O que equivale à seguinte inferência lógica:

1.     Se p é não honesto, logo p não pode vir a ser q (presidente);
2.     p é q (presidente);
3.     logo, p é honesto.

Um brilho de inferência. Digno de prêmio (ig)nobel, na categoria “falácias.”


Trata-se do truque de estabelecer o fundamento de uma inferência com base na conclusão do que ela mesma quer provar. Algo que os antigos céticos definiam como “dialelo”, ou raciocínio circular. Em outros termos, coisa para enrolar a malta. A inferência em questão bem vale, enfim, como introdução à lógica temerária. Tempos difíceis.

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